A importância da imersão nos games 

A importância da imersão nos games 

19 de janeiro de 2025 Off Por Allan Lima

Você está dirigindo um carro em um jogo de corrida e vira o corpo junto para fazer a curva; dá aquela esticadinha de pescoço para olhar pelo canto da parede no jogo de terror, ou então fica triste com determinado destino daquele seu personagem favorito. Depois de algum tempo, você desliga o videogame e percebe que nem viu o tempo passar, tendo jogado horas com a sensação de ter sido somente alguns minutos. 

Mas espera um pouco, vamos aproveitar essa volta à realidade para pensar um pouco: Jogos eletrônicos nada mais são do que um conjunto de sistemas e polígonos pré-programados com o propósito de entreter – nada do que você vê na tela é orgânico ou real, então como é possível nos envolvermos tanto? A resposta pode ser um pouco complexa, mas sempre irá orbitar um termo que foi muito utilizado nos últimos anos quando o assunto é videogame: Imersão.  

Segundo o nosso dicionário, imersão é o ato ou efeito de imergir(-se); imergência, submersão. O uso desse termo então é perfeito porque é exatamente essa a sensação que temos ao jogar um jogo imersivo, a de mergulhar em um ambiente virtual e, por algum tempo, tomar aquilo como uma realidade. 

A imersão pode transformar a experiência de jogar videogame, dando vida à personagens, dando propósito a certas ações e até nos envolvendo emocionalmente; mas se o resultado é claro, o caminho até chegar a ele talvez nem tanto. Basta o jogo ter gráficos de ponta? Uma boa história? Gameplay realista? Por que um aspecto tão subjetivo pode ser tão importante para a experiência como um todo? Na era atual dos games, na qual até hardware dedicado a isso nós temos – os famosos óculos de realidade virtual – vale a pena fazermos uma análise um pouco mais cuidadosa de um aspecto que se tornou uma constante em quase toda análise e debates acerca dos games.  

O caminho para a imersão 

Comecemos então pelo aspecto mais óbvio e o primeiro a normalmente ser associado à imersão: Os gráficos. O nosso primeiro contato com o jogo é através dos elementos gráficos que formam as imagens na tela, nos apresentando o visual dos personagens e uma ideia geral de como aquela nova realidade irá se parecer. Mas embora seja um aspecto que de fato pode ser importante, eu diria que seja um dos menores – ou o menor deles. 

O primeiro Silent Hill é, até os dias de hoje, um jogo que ainda está no meu top 10 quando penso em jogos imersivos, mesmo com o visual quadrado e pixelado da época. Já é de conhecimento popular que a névoa era usada para esconder limitações técnicas do Playstation, mas vejam só, acabou sendo não só uma marca registrada da franquia, como também um recurso que trouxe uma imersão diferenciada se comparado a outros jogos da época.  

Além da névoa, Silent Hill usava e abusava também dos recursos sonoros, que iam desde músicas carregadas de suspense até o famoso som do rádio, que tocava sempre que algum perigo espreitava. Silent Hill trouxe luz ao termo “terror psicológico”, para definir jogos que não se escoravam em jump scares e visuais grotescos para assustar o jogador, mas sim no uso sutil de diversos elementos que juntos entravam na mente do jogador e o fazia sentir medo o tempo todo. Percebem? o jogo buscava entrar na mente do jogador e fazia isso com tamanha maestria que resistiu ao teste do tempo, fazendo com que os gráficos fiquem em segundo plano. 

A névoa em Silent Hill causava medo do desconhecido

Diante do exemplo do Silent hill, é seguro afirmar que a imersão vem com a combinação de diversos aspectos, mas eu acho válido destacar um: O som. Aí entram dois tipos: O ambiente, que compõe desde o som do tiro até os passos do personagem; e o musical, que traz a trilha sonora responsável por ditar a tonalidade que o momento pede. Ambos são cruciais para transmitir sentimentos ao jogador, e se trabalhados de forma correta podem fazer com que a experiência seja imersiva a ponto de não se limitar ao momento em que o controle está nas mãos, mas também para além dele – quem nunca desligou o videogame e ainda ficou pensando nos rumos da história, ou escutou determinada música anos depois e sentiu uma onda de nostalgia? 

O caminho para fazer um jogo imersivo exige, sobretudo, criatividade para usar todos os recursos de maneira a compor um grande quebra-cabeça, mas eu acredito que é necessária também uma ajudinha extra do público alvo. 

Um trabalho em conjunto 

Ainda que os jogos estejam cada vez mais complexos e imersivos, eles ainda são apenas… jogos. Nem sempre os personagens vão se movimentar de forma natural, nem sempre estaremos livres de bugs, e muitas vezes serão feitos sacrifícios no realismo em prol do gameplay, tudo isso pode acabar quebrando a imersão se o jogador não estiver “trabalhando” junto.

Às vezes o jogo vai nos lembrar de que é apenas um jogo…

Existe um termo chamado “suspensão de descrença”, usada para descrever a nossa pré-disponibilidade em aceitar certas premissas como verdade em troca do entretenimento, mesmo que essas premissas sejam impossíveis ou contraditórias. Quando você está assistindo um filme de terror, você percebe que a atitude do personagem em andar à procura daquele barulho no escuro não é exatamente a decisão mais natural do mundo, mas no fundo você sabe que aquilo é preciso para que o enredo do filme se desenrole, então você simplesmente aceita; assim como é impossível um humano voar, mas dentro de um universo como o de super heróis você simplesmente aceita aquilo como verdade, quase que inconscientemente. Em jogos, essa suspensão da descrença é muito mais exigida do jogador, afinal, de que outra maneira conseguiríamos nos manter imersos depois do personagem constantemente tomar diversos tiros e se curar com uma bandagem? 

Esse “trabalho” do jogador pode até mesmo diferenciar sua forma de jogar aquele jogo em relação a outros jogadores, moldando a experiência de uma forma muito mais pessoal. Um jogador que preze mais pela coerência dentro do universo de Red Dead Redemption 2, por exemplo, tende a usar menos o fast travel para se locomover, da mesma forma que tendem a fazer atividades não-obrigatórias, como a de levar comida ao acampamento, porque afinal é isso que Arthur Morgan faria. Se você, leitor, já jogou RPG de mesa, vai entender melhor essa questão, pois é um tipo de atividade que exige constantemente o uso ativo da imaginação para que você consiga se sentir dentro da realidade proposta pelo mestre, e não na sala de estar em volta de uma mesa segurando fichas e um dado.

Mas e os jogos que não são imersivos?

Embora a imersão sem dúvida alguma seja uma grande adição à experiência, nem todos jogos conseguem ou sequer buscam ser imersivos, e é importante entendermos que isso não faz o jogo ser ruim. Alguns jogos são mais descompromissados, fazendo com que o jogador se sinta mais “do lado de fora” da experiência, mas ainda gerando bastante diversão. Astrobot é um grande exemplo, o recém premiado jogo do ano é um jogo mais cartoonesco, que incentiva o jogador a jogar sem fones de ouvido (o jogo usa bastante os speakers do dualsense) e curtir a diversão e carisma dos bots de forma leve. Bom… estamos falando de um jogo do ano, não é mesmo? Funciona. 

O videogame em seus primórdios também não era exatamente uma experiência imersiva, no sentido mais estrito da palavra que discutimos aqui. Isso nunca impediu que as pessoas se divertissem e muitos até defendem que o videogame em sua essência é isso mesmo, pegar o controle, chamar os amigos e dar risadas ao redor da TV, passando de fases, tirando um contra sem compromisso no jogo de luta, escutar aqueles sons 8 e 16 bits típicos da época e é isso. Ora, talvez esse tipo de experiência seja imersiva à sua maneira. Não há certo ou errado, apenas diferentes abordagens e sensações.  

Essencial? 

Estamos em uma era na qual somos constantemente bombardeados de informações e distrações o tempo todo, a indústria do entretenimento tem que lutar uma batalha cada vez mais árdua para ganhar a atenção do consumidor e, diante disso, fica cada vez mais difícil fugir do termo “imersão” quando o assunto é videogame, primeiro no sentido de este ser usado cada vez mais como uma maneira de marketing, segundo no sentido de termos uma necessidade cada vez maior de nos sentirmos “fisgados” pelo jogo, de termos aquele experiência mais cinemática e marcante, de fazer valer o nosso suado dinheiro.  O fato é que a imersão é sim importante para que possamos nos conectar com o jogo, com os personagens, e, sobretudo, com a experiência de jogar videogame, um tipo de mídia de entretenimento que pode se beneficiar imensamente da sensação que o termo propõe. Importante? Sem dúvida. Essencial? Talvez, quem responde é você. 

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