ENTREVISTA sobre a BGS – Um Evento Inclusivo e Uma Jornada em Busca da Acessibilidade
21 de outubro de 2022O número de jogos que trazem ferramentas de acessibilidade para incluir jogadores com os mais variados tipos de deficiência tem aumentado com o passar dos anos. Um bom exemplo de jogo que oferece uma grande diversidade de funções acessíveis é The Last Of Us 2.
Em um mundo como o nosso, bastante diversificado, com pessoas dos mais variados tipos, com suas necessidades, tornar a experiência inclusiva é um dever de todos. No entanto, isso não pode se restringir apenas aos games e, a Brasil Game Show, sabe bem disso.
Podemos encontrar diversos tipos de eventos de jogos espalhados pelo mundo, mas será que todos estão preparados para lidar com as necessidades dos seus consumidores e expositores? Bom, por isso decidimos trazer uma matéria para tratar especialmente sobre esse assunto na Brasil Game Show de 2022.
Logo ao chegar, reparamos que havia diversas pessoas deficientes participando do evento, seja trabalhando ou para se divertir e explorar tudo que a BGS trouxe para todos nós. Eu e o Allan Lima conversamos com algumas pessoas que estavam trabalhando para entender mais de como estava sendo a experiência para eles, já que não é todo evento que oferece acessibilidade em seus estandes e seu espaço de modo geral.
Entrevistamos a promotora de eventos Dayane Lima, um dos principais rostos que víamos ao chegar na Brasil Game Show, recepcionando os fãs que vieram dos mais variados lugares do país para prestigiar o evento também.
Fico muito feliz em ver que o evento parece estar bastante receptivo em questão da acessibilidade, pois sinto falta de ver isso em outros lugares. Como que está sendo o evento para você e de estar trabalhando aqui?
Dayane: Eu já sou promotora de eventos a quatro anos e o que eu achei muito legal da BGS, porque normalmente, nos eventos que eu trabalho, é apenas uma pessoa com deficiência. Tem vinte promotores, mas apenas um é deficiente. E, na BGS, em todos os cantos têm promotores e pessoas com deficiência trabalhando, ocupando o seu lugar na sociedade, como trabalhador. Já que, normalmente, a sociedade não vê. Acham que pessoas com deficiências não trabalham e não fazem nada. A questão da acessibilidade, de modo geral, tanto do evento quanto dos estandes e da Expo Center Norte (local onde ocorreu o evento), eu consigo acessar a todos os lugares, acessar todos os espaços e ter autonomia e liberdade. Não tem aquele lance de precisar de alguém para ir ao banheiro ou coisas do tipo. Está muito inclusivo, atingindo todas as pessoas e muito abrangente de uma forma geral.
A Brasil Game Show dá espaço para diversas pessoas com deficiência poder trabalhar. Como foi o tratamento para que vocês conseguissem esse espaço?
Dayane: Eu vim através de um contato de uma amiga minha, que já havia trabalhado em outras edições da BGS. Ela passou o contato de outras pessoas da organização e eles falaram: “precisamos de alguém para recepcionar, para estar ali e abordar o pessoal”. Eles foram muito cuidadosos em todos os sentidos. Na nossa equipe são dezoito ou vinte cadeirantes e eles tiveram a atenção com o transporte do evento até o metrô mais próximo, de ida e volta, atenção com a alimentação e, eu, como promotora de evento digo, normalmente, isso não acontece. Nos trataram como pessoas, como realmente somos. Normalmente, as pessoas só veem a cadeira de rodas. Quem chega primeiro é a cadeira de rodas e depois a Dayane, e aqui, quem chegou primeiro foi a Dayane e não a cadeira, sabe?
Você que está na recepção do evento, qual a sua visão a respeito dos deficientes que estão vindo conhecer o evento? Você acha que esse público está bem presente por aqui também?
Dayane: Eu fiquei surpresa, realmente, com a quantidade de pessoas deficientes estão vindo para o evento, para conhecer, para viver a experiência da BGS. Um público muito grande, com vários tipos de deficiências, desde deficiências visíveis até invisíveis também. De todos os eventos que eu já fiz na vida, eu acho que nunca vi tantas pessoas com deficiências, não só trabalhando, mas podendo aproveitar essa experiência. Pessoas fantasiadas, se divertindo, realmente vivendo essa experiência e sendo muito bem acolhido e muito bem recebido.
E para finalizar, você que está recebendo o pessoal, percebe se há algum tipo de preconceito, não por parte do evento em si, mas de pessoas de fora que não aceitam bem, estarem sendo recebidas por deficientes? Gera algum estranhamento para alguns?
Dayane: Infelizmente, sim. A gente vive em um mundo muito capacitista, onde enxergam as pessoas com deficiência como um inválido e incapaz. A gente está aqui, eu pergunto se posso ajudar e algumas pessoas respondem que não e perguntam para a moça do lado, já que ela não tem deficiência. Ou, eu passo a informação e confirmam com outra pessoa sem deficiência. Ainda há pessoas que olham e dizem: “Você não, moça. Você, não!”. Então tá bom, né. Mas isso não é só na BGS. Pessoas com deficiência sofrem muito preconceito, não só pelo tratamento, mas pela falta de acessibilidade. O capacitismo se demonstra de várias formas. Infelizmente tivemos algumas pessoas do público que se comportaram dessa forma. A gente espera que em um futuro breve, essas pessoas evoluam, fiquem livre desses preconceitos e passem a ver as pessoas por serem quem são e não pela deficiência. A deficiência é só mais uma característica minha, assim como a cor do meu batom, a cor do meu cabelo. A Dayane é a Dayane, a deficiência acompanha a Dayane, mas nunca está à frente da Dayane.
Após entrevistarmos a Dayane, andamos pela BGS observando a acessibilidade dos estandes para ver se era possível as pessoas que estivessem ali pudessem, de fato, aproveitar 100% do evento. Um dos primeiros estandes que encontramos próximo ao local de entrada, era o estande da Acer.
O estande da Acer estava, visualmente, muito bonito, repleto de computadores para os visitantes jogarem e testarem os produtos, literalmente, com a mão e tudo. Assim como a imagem de capa da matéria, o estande da Acer contava com rampas bem visíveis, contornadas com uma fita em verde fluorescente. Outro ponto bem interessante desse estande, estava relacionado à altura das mesas onde os visitantes poderiam jogar. Algumas mesas estavam mais baixas do que o convencional para cadeirantes poderem jogar com maior conforto.
Eu tive a oportunidade de conversar com uma das representantes do estande da Acer e ela disse que estavam muito felizes por poder proporcionar um estande acessível. Além da presença de rampas e a redução da altura das mesas, havia um elevador para cadeirantes subirem ao palco e participarem do Meet & Greet que acontecia frequentemente por lá. Foi uma ótima oportunidade de entender como estava sendo para o estande ser mais inclusivo.
Em relação a rampas, não vimos nenhum estande que não possuísse acesso com rampas. Alguns apresentavam mais de uma entrada, já outros, apenas uma. De modo geral, cadeirantes estavam bem amparados por onde passavam.
Um outro estande que vale a pena destacar aqui é o da Nintendo. Eu conversei com a mãe de um garoto autista e, para a minha surpresa, por mais que ela não entendesse nada do universo dos games, ela estava muito animada com o evento e em como o filho dela estava feliz conversando com o pessoal do estande. Vale lembrar que o estande contava com pessoas sempre a disposição para melhor atendê-los.
Outro ponto bastante relevante no estande da Nintendo é a existência de um espaço reservado apenas para cadeirantes jogarem. Em todos os lugares que passamos, deficientes, de modo geral, não precisavam enfrentar as grandes filas para aproveitar os jogos e tudo o que tinham para oferecer.
Conversamos com mais pessoas no estande, inclusive, com um jogador em uma cadeira de rodas. No início, ele estava envergonhado de ir jogar e optava por assistir aos outros jogarem. No entanto, em uma ida ao estande da Playstation, um dos representantes do estante o cativou a jogar, fazendo com que ele se sentisse mais à vontade ao explorar todo aquele espaço e o mesmo aconteceu no estande da Nintendo. Ficaram felizes em poder participar como todas as outras pessoas que estavam ali e disseram nunca ter participado de um evento com tanta inclusão.
Apesar do principal foco da matéria até agora ter sido direcionado para cadeirantes, não era apenas eles que estavam amparados pelos estandes. Sempre era possível encontrar intérpretes de LIBRAS nos estandes e nas entrevistas concedidas pelas celebridades durante o evento. Na entrevista com o diretor e produtor de Street Fighter 6 (para acessar a matéria, clique aqui), havia uma tradutora para localização em português das falas do Nakayama e do Matsumoto, mas também uma intérprete de libras para não deixar ninguém de fora. O mesmo vale para o bate-papo com Takashi Iizuka, diretor criativo de Sonic.
O estande da Evoverse também contava com intérpretes para auxiliar as pessoas que estavam por lá. O estande era grande e possuía bastante espaço para os visitantes se locomoverem e aproveitarem o jogo por lá. No momento em que estávamos lá, havia diversas pessoas acompanhadas pelos intérpretes e foi bem bacana de ver. Aproveitamos para registrar esse momento e conseguimos trazê-lo para a matéria.
A única coisa que sentimos falta por lá foi relacionado aos deficientes visuais. Não encontramos nada que pudesse representá-los por lá. Se você esteve lá ou faz parte da organização do evento e saberia informar melhor a respeito, basta entrar em contato com o site pelas redes sociais para acrescentarmos.
Conclusão
A Brasil Game Show se mostra um evento muito inclusivo em diferentes quesitos. As pessoas que frequentam o evento saem de lá maravilhadas com tudo que encontram e ansiosas para estarem lá novamente no ano seguinte. A BGS 2022 traz como seu slogan “De Volta ao Jogo” e não é à toa. Assim como o Marcelo Tavares, principal responsável pela existência do evento, disse na coletiva de imprensa, o evento traz “De Volta ao Jogo” em um evento pós pandemia, porque passamos de fase. Passamos uma fase ruim sem eventos, sem socializarmos, sem estarmos em meio ao contato humano e agora estamos retornando com tudo. Todos podem aproveitar essa experiência, indo desde aos mais novos, até os mais velhos. Dentro e fora do universo gamer. Mas, principalmente, um evento acessível para que pessoas com os mais variados tipos de deficiência se sintam inseridas e possam aproveitar o grande evento da Brasil Game Show. Espero que essa matéria mostre para outros organizadores de eventos o quanto nós podemos tornar a experiência desses momentos mais inclusivas e acessíveis para todos.
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