Como o PlayStation Transformou Videogame em Coisa de Adulto

Como o PlayStation Transformou Videogame em Coisa de Adulto

1 de junho de 2025 Off Por Markus Norat

A quebra de paradigma que tirou os games do universo infantil

Por muitos anos, videogames foram vistos como brinquedos voltados exclusivamente ao público infantil. Com gráficos simples, mecânicas descomplicadas e personagens caricatos, os jogos eram tratados como uma extensão dos desenhos animados de sábado à tarde. Mas esse cenário começou a mudar radicalmente nos anos 1990 — e foi o PlayStation, da Sony, o maior responsável por essa transformação histórica. Mais do que um console de sucesso, ele representou o amadurecimento definitivo da indústria, abrindo as portas para narrativas adultas, jogabilidade complexa e uma estética mais cinematográfica.

A seguir, você confere como o PlayStation quebrou o estigma infantil e transformou o videogame em um meio de expressão digno de adultos.

🎭 A narrativa amadureceu

Um dos pilares fundamentais dessa transição foi a introdução de histórias densas e temas complexos nos jogos. Com a chegada do CD-ROM, o PlayStation permitiu armazenar não só trilhas sonoras de alta qualidade e gráficos mais elaborados, mas também longas cenas em vídeo e uma profundidade narrativa antes impossível.

Títulos como Final Fantasy VII, Metal Gear Solid e Silent Hill não apenas entreteram — eles emocionaram, chocaram e fizeram pensar. O jogador passou a vivenciar dilemas éticos, temas como morte, terrorismo, depressão, identidade, manipulação midiática e existencialismo. Era um salto qualitativo tão grande que muitos adultos passaram a ver os games sob outra ótica: não mais como simples diversão, mas como obras interativas de arte e reflexão.

🎬 A estética ficou cinematográfica

A Sony sabia que precisava atrair o público jovem-adulto, especialmente aquele que havia crescido jogando 8 e 16 bits e que agora buscava experiências mais maduras. Para isso, investiu pesado em criar jogos com apelo visual inspirado no cinema e na cultura pop da época. A linguagem visual dos jogos passou a contar com cortes de câmera dramáticos, trilhas sonoras orquestradas, dublagens realistas e ambientes sombrios.

Metal Gear Solid, por exemplo, é um dos primeiros jogos a ser abertamente descrito como “cinematográfico”, com cenas de corte complexas, diálogos extensos e trilha sonora digna de blockbuster. O próprio Resident Evil, com sua ambientação inspirada em filmes de terror e ficção científica, levou o medo a novos níveis — não mais com fantasmas ou bruxas cartunescas, mas com zumbis, vírus e experimentos militares.

👾 O controle também amadureceu

A evolução dos controles refletia esse novo posicionamento. O DualShock, lançado em 1997, trouxe analógicos duplos e motores de vibração, ampliando o grau de imersão. Isso permitiu experiências mais ricas e complexas, como o controle preciso de veículos, a movimentação fluida em ambientes tridimensionais e o realismo em jogos de tiro, espionagem e simulação.

Além disso, as próprias mecânicas dos jogos deixaram de ser intuitivas para se tornarem desafiadoras, táticas e inteligentes — características que exigiam mais raciocínio, tomada de decisão e até leitura de textos densos. Essa sofisticação afastava o rótulo de brinquedo e dava ao videogame o mesmo status de atividades culturais como livros, filmes ou RPGs de mesa.

🔞 O conteúdo ficou mais ousado

Com o PlayStation, os jogos também abraçaram o conteúdo mais ousado, sem medo de tocar em assuntos tabus ou mostrar violência com mais realismo. Essa mudança exigiu uma nova forma de regulamentação — e é nesse contexto que a classificação etária dos games começou a se consolidar como algo relevante no Ocidente.

Títulos como Tomb Raider, com sua protagonista sexualizada e enfrentando cultos e demônios, Parasite Eve, com temas de terror biológico, e Driver, com perseguições policiais violentas em cidades realistas, tornaram-se marcantes justamente por não subestimarem a maturidade do jogador. Pela primeira vez, havia jogos feitos explicitamente para adultos — e que não pareciam ter saído de um desenho animado.

🎧 A trilha sonora que cresceu com os jogadores

Outro elemento essencial na consolidação do amadurecimento dos games foi a trilha sonora. O PlayStation aproveitou o potencial do CD para incluir músicas licenciadas de verdade, trilhas eletrônicas e até orquestrações completas. Jogos como WipEout apresentaram faixas de bandas conhecidas da cena techno e rave da Europa, conectando-se diretamente ao público jovem urbano. Isso fortaleceu a imagem de que o videogame já não era uma brincadeira de criança, mas uma experiência cultural contemporânea e conectada com o mundo real.

👥 A propaganda falava com adultos

A própria forma como o PlayStation foi anunciado ao mundo já indicava sua ambição de ser diferente. A publicidade do console era provocativa, irônica, muitas vezes sombria. Os comerciais de TV não mostravam crianças se divertindo em mundos coloridos — mostravam jovens em ambientes urbanos, gráficos imersivos, frases filosóficas e slogans desafiadores como “Live in your world. Play in ours.”

Essa estratégia de marketing criou um novo imaginário: jogar videogame já não era algo que você “superava ao crescer”, mas algo que crescia com você.

📈 O mercado respondeu — e cresceu junto

O impacto do PlayStation foi tão profundo que mudou para sempre o perfil demográfico dos gamers. Ao fim da década de 1990, estudos de mercado já indicavam um crescimento significativo no público entre 18 e 35 anos. Os games passaram a competir com cinema, música e literatura na atenção dos adultos jovens — e até na crítica especializada.

O sucesso do PlayStation mostrou ao mundo que não apenas havia espaço para jogos adultos, como havia demanda por eles. E essa demanda só cresceria com o tempo, pavimentando o caminho para títulos ainda mais ousados nas gerações seguintes.


O PlayStation foi o divisor de águas que reescreveu a identidade dos videogames. Ao colocar a narrativa, a estética, o conteúdo e a jogabilidade em um novo patamar de maturidade, a Sony deu voz a uma geração de jogadores que não queria abandonar os games, mas sim vê-los evoluírem junto com eles.

Hoje, quando você joga um RPG com enredo filosófico, um jogo de ação com dilemas morais ou um simulador hiper-realista com narrativa interativa, lembre-se: foi o PlayStation que abriu as portas. E a partir dali, os games nunca mais foram apenas coisa de criança.

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